21 dezembro 2008

O ano já acabou

Você pode até desconfiar do calendário cristão, mas ninguém está imune aos planos e reflexões dos últimos dias de dezembro. Ando revisitando memórias, lembrando de dezembro do ano passado, quando dizia que aprendi a rir de mim mesmo. Em 2008 dá para dizer que vivi o ano da hora de crescer, com todas as irregularidades que essa afirmação possa ter. E também com todas as suas consequências (repare que já me livrei do trema).
Sonho muito menos do que antes (o Obama sonha mais), o que não é bom nem ruim. Vou pé no chão, com toda a coragem e a falta dela. Sobram saudades acumuladas - de amigos, momentos, circunstâncias. Para completar, o mundo está em crise, e há muito tempo antes da bolha imobiliária. Há crise em todos e eu sou mais um filho dela. No meio do zunzunzun, tentando entender a macroeconomia da Terra, esqueci de entender a economia da minha vida. Well...
Também bate saudade de sonhar mais, é claro. Já sinto falta até mesmo dos momentos difíceis de 2008, de grande aprendizado. No final das contas, sempre direi que o ano, seja qual for, valeu a pena. Só não consigo saber o desejo do que virá. Não aprendi a fazer planos tão consistentes, pelo menos como deveria. Não desta vez, Bruno.
Fiz 25 anos, cheio de história pra contar, com felizes momentos, até porque ninguém é de ferro. E apesar das lembranças, parece que a saudade é coisa barata na metrópole que come nosso tempo. Sou mais uma metamorfose paulistana, com algumas baldeações acumuladas nas horas de vôo. Vamos ver no que isso vai dar. Dizem que ter dúvidas, eliminar todas as certezas de antes, pode ser sinal de crescimento. Aposto nesta tese, ela é mais bonitinha.
Bom final de ano a todos que me fazem sorrir. Que 2009 seja menos tenebroso do que as previsões - tem gente mais evoluída que já se dedica a isso. Be happy, my friends!

22 novembro 2008

Pobre Somália

A Somália, ex-colônia italiana e britânica, voltou aos jornais. Mais especificamente os somalis, que correspondem a 85% da população do país no Chifre da África. Com 48 anos, as imagens que o mundo se acostumou a receber deste lugar, principalmente nos anos 90, são cenas da guerra civil, fome e miséria. A catástrofe, dizem especialistas, é resultado de conflitos com a Etiópia e dos “senhores da guerra” patrocinados pelos EUA. Quem não leu muito jornal, mas não deixou a pipoca do cinema de lado nos últimos anos, talvez tenha assistido à versão hollywoodiana em Falcão Negro em Perigo. Na tela e na vida real, 18 soldados norte-americanos morrem na frustrada operação e os Marines se retiram. Para o Estado esfacelado, as tropas da ONU deram tchau em 1995.

Evidente que as operações da última década não eram altruístas. Tampouco a engenhosa ação preparada nos útlimos dias por marinhas de países como EUA, Alemanha, França, Grã Bretanha, Rússia e Coréia do Sul. Diante da crescente pirataria somali no Golfo de Áden, as nações estão dispostas a impedir que petroleiros dêem mais prejuízo no desvio de rota para fugir dos recentes seqüestros de navios e do superpetroleiro saudita com US$ 100 milhões em petróleo. Até a privada Blackwater, o exército mercenário que matou no Iraque, se ofereceu.

É a lógica da globalização. Se é que há lógica no mundo que paga o pato de executivo que ganha os mesmos US$ 100 milhões do petroleiro nos cinco meses antes da atual crise econômica. A lógica? A Somália ficou renegada à prórpia sorte desde sempre, destruída. Como dizem, se um país, ainda mais uma terra de ninguém, não tem nada a oferecer, ele terá o pior destino possível: não será “nem” explorado. Esquecida, ironicamente, a Somália volta em 2008 pelas mãos dos piratas.

A pirataria somali começou na década de 1990. Segundo a ONU, já são 65 navios seqüestrados neste ano. Um terço da população da Somália, 3,2 milhões de pessoas, necessitam de ajuda humanitária.

foto: Sebastião Salgado

20 novembro 2008

FICÇÃO - Como Winehouse para Lady Di

Priscila nasceu para ser a exceção à regra. Os pais, que esperavam por menino, nada fizeram para evitar as combinações disponíveis em verde e azul para as primeiras roupas. Talvez seja a razão da natureza contraditória que cedo se manifestou na sua vida. Podia ser sórdida e dócil, com a delicadeza dos brutos. Se mulheres viessem ao mundo com um manual de instruções, ele fracassaria com ela. Priscila é, até hoje, o exemplo maior da espécie feminina que vigora no século XXI. Nunca vi força semelhante capaz de chicotear na cara dos teóricos de plantão que mulher reúne o sim e o não. Depois dela fico até envergonhado em reconhecer que homem é bicho reduzido e maniqueísta, água ou vinho. Elas, só elas, são capazes de misturar o sagrado ao profano, Foucault com You Tube, spinning e pilates.

Algumas verdades do senso comum se desmancharam em mitos. Ir ao banheiro em grupo. Para Priscila, banheiro era o lugar de estar só, na intimidade em fuga de um mundo com bilhões de formigas. Mas, quando viu no cinema a executiva convicta recolher-se no toalete da empresa em que trabalhava para berrar toda a raiva que em silêncio cultivava cirroses, considerou aquilo tão ridículo que readmitiu a idéia do bando para a fofoca do pipi. Anos depois a questão ganhou asas comerciais, banheiro feminino virou nome de site e ela esteve certa de que o fim dos tempos estava próximo.

Se a moda prenunciava o uso de scarpin, ela arrancava as galochas do fundo do baú e causava alvoroço na rua. Todas as atitudes indicavam que tinha maneiras próprias de se colocar no mundo. Feliz por não ter nascido na época da sua bisavó, compreendia o casamento encomendado e os crochês pelo resto da existência como males evitados pelo tempo e pela ordem de chegada dos espermatozóides nos óvulos, que desviaram a sua existência da era Cenozóica para que pudesse desabar de pára-quedas no mundo dos homens que assumem sem remorsos o ofício de babás. Seu mamão com açúcar predileto era perceber que sexo não é mais aula de anatomia e que ninguém pensa em apedrejar a Madonna.

Quando nos conhecemos, ela implorava por um Engov em algum bar que fiz questão de esquecer. Organismo recomposto, o perfil “eu sou pós-feminista” foi tudo o que captei. Feito macho moderninho, concordei com todo o liberalismo: a cabeça pra cima e pra baixo diante da autêntica Amélie Poulain na contramão, a do contra. Gargalhada feroz foi resposta que doeu nos ouvidos. Eu, o macho altamente desesperado por um manual de instruções, fiquei sem graça. Ela, atrás dos imensos óculos de mosca, se virou e foi embora para nunca mais.

Guardo lembranças daquele ser que daria orgulho a Darwin. Fui para casa, recolhido, insignificante e perdido ao lado de tantos reduzidos e maniqueístas que perambulam por bate-papos virtuais. Hoje, o cenário invertido e tudo, tenho amigos companheiros nas idas ao banheiro masculino. Nada das velhas piadas machistas. Conversamos sobre Priscilas e suas charadas. Todos me garantem a permanência de duas verdades imortais: mulher nenhuma espera ser chamada de engraçada, nem perguntas sobre quantas primaveras carregam nas olheiras e rugas.
Que desgraça! Priscila já dobrou trezentas esquinas depois daquele dia, aderiu e abriu mão do bando do pipi outras trezentas e nós teimamos em escrever outro manual.

12 novembro 2008

Short Shirts

Conheci Matthew Shirts, o californiano tupiniquim que escreve crônica toda segunda-feira no Estadão e chefia a redação da National Geographic brasileira. Matt é mais engraçado falando do que escrevendo. Para uma colega que perguntou como fazer um jornalismo mais divertido ele deu de presente a gargalhada quilômétrica antes de lembrar que as pautas da nossa grande imprensa são guiadas pela miséria, corrupção, subdesenvolvimento e pela "sensação de que algo não deu certo na trajetória". Poderíamos gastar alguma energia com o humor, com as nossas qualidades e com o povo brasileiro, "que se entende muito bem", segundo Matt.
Obrigado a Shirts pelo momento de leveza. Seria muito bom ampliar olhares e ouvidos ocupados demais com o grampo e os arapongas da impunidade e do Deus dará de sempre. O Brasil oficialesco raso não merece a comparação com as cores do Brasil profundo. "Afinal, as coisas poderiam estar piores", disse Matt. Seguiu-se uma nova gargalhada e eu nem conseguia imaginar qual cenário poderia ser pior.

26 outubro 2008

No Peru

A “cidade dos reis” e capital do Peru não está acostumada às chuvas, apesar do característico céu nublado. Contrariando a média de três milímetros para outubro, uma leve garoa molhava Lima na manhã do dia 21. O chuvisco não exigia guarda-chuvas. Na paisagem do mirante da praia de Miraflores, a vida continuava com cara de cartão postal e, pelas ruas centrais, as pessoas andavam à vontade, apesar de surpreendidas pela água. Nos cruzamentos mais disputados, onde a negociação da passagem se dá com festa de buzinas e má sinalização, a colisão dos amassados e remendados carros dos anos 80 parece inevitável.
Nas obras que se avolumam na cidade, operários se concentram nos trabalhos em asfaltos e viadutos. Lima abre espaços, em esquinas de bairros como San Isidro, para concentrar fast foods. Parece piada: a cozinha peruana, com seus pesacados e influências criollas, é admirada em todo o mundo. Nos três dias na cidade optei pelo típico, como ceviche e pisco.
Pelas ruas, mesmo no dia da chuva, a construção civil avançava. Até parecia alheia ao caos no trânsito e aos recentes escândalos com grampos do governo federal.



A rápida passagem pelo Peru reservou bons momentos e alegrias, excetuando a mística e inusitada Inca Kola, o refrigerante que, nacionalismos à parte, lembra mais um chiclete líquido.

Na madrugadada do dia 22, o Tequila Rock da avenida La Marina fervia. Uma música de difícil explicação. Nada a ver com a tradicional marinera peruana. No ambiente cheio de vídeos um tanto calientes, o ritmo parecia misturar funk carioca com a tecnera da cúmbia - aquela dança do Tévez, lembram? Mais difícil era quebrar o quadril para dançar como todos peruanos que engatavam em pares nada comportados. Foi divertido. Do palco, dois locutores comentaristas (???) nos acharam: "a los estranjeros!".

No dia seguinte, entre outras coisas, o corpo moído depois das Cusqueñas bebidas na noite anterior. Por razões misteriosas, nosso grupo encontrou ânimo para jogar futebol com os peruanos, num gramado da pobre Cañete, 190 km ao sul de Lima. Niños e niñas gritavam por "avante brasileños, vá Ronaldinho!". Nós, os sedentários e barrigudos, tínhamos o esforço estampado na cara, tudo para corresponder à megalomaníaca expectativa da população infantil do local.
Resultado final: Peru 1 x 0 Brasil. Desculpas às crianças de Cañete, fica para a próxima.



mais fotos no Peru

20 outubro 2008

A tabacaria do Sul

Santa Cruz do Sul é o epicentro do tabaco no sul do Brasil. Quem está perdido por alí, na cidade pacata de 115 mil habitantes, não deve acreditar que as folhas em linhas sem fim, nas lavouras ao redor do município, são de alface. São Virgínias e Burleys que fazem a alegria das processadoras de fumo (a maioria norte-americana) e das cigarreiras. É um complexo industrial fortíssimo.
Os homens que dirigem as empresas e as entidades do fumo nessa região são precavidos. Se em algum momento são orgulhosos do clima e terra tão propícios ao tabaco, em outros falam de prevenção do trabalho infantil, baixo uso de agrotóxicos, cultura do fumo herdada dos antigos colonos alemães, importância do Brasil no mercado mundial e por aí vai. Também falam sobre necessidade de diversificação de culturas, o que parece um paradoxo, afinal eles fazem muito, muito dinheiro com o tabaco. Mas eles garantem que não: a diversificação é importante e essa é a luta.
Só no ano passado, as 755 toneladas que o Brasil exportou para o mundo todo renderam US$ 2,2 bi. Só com tributos sobre o cigarro o Tesouro Nacional recolheu R$ 7 bi. Em Santa Cruz do Sul, nas sedes de cigarreiras e produtores, não vi um só fumante.

Articulado também é o sr. Milton Fuelber, de 47 anos. Ele foi apresentado pela Alliance One, beneficiadora de fumo, como produtor modelo do sistema integrado de produção que as empresas incorporaram ao lugar. Na última safra, Milton colheu mais de 12 toneladas de tabaco que secaram nas estufas de sua propiedade. Com fala eloqüente, ele nem parece preocupado em plantar mais milho do que fumo. O bolso agradece. O hectare do primeiro vale R$ 1,2 mil; o do segundo bate os R$ 15,1 mil.



Catedral de Santa Cruz do Sul

30 setembro 2008

O admirador dos marginais

No rosto magro e comprido, atrás dos óculos de armação fina, estão olhos escuros, pequenos e aproximados. A impressão enganosa de desinteresse pelo que está ao redor surge quando senta, à vontade e inclinado, como quem busca descanso. É enganosa a impressão porque há uma naturalidade na postura. Percebe-se elegância no gesto, sempre marcado pela posição das mãos de dedos compridos, que às vezes estão juntas e escondidas entre as pernas constantemente cruzadas. Quando cansa deste modo, usa as costas da mão direita para servir de apoio ao rosto, ou, então, simplesmente cruza os braços com a mesma elegância displicente de antes. Raramente fala.

Alto e magro, ele não é um sujeito que passa sem que se perceba a camiseta, o jeans e o All Star. Do jeito que se veste, se misturaria fácil com os músicos que sobem, atrás de guitarras, a rua Teodoro Sampaio, em São Paulo. Entre colegas de curso, vindos de diferentes lugares do Brasil, também consegue ser invisível, sair e entrar nas rodas de conversas sem nada falar e com total sutileza, para ficar no seu canto, recluso e reservado. Quando atento, levanta as sobrancelhas, que só retornam à posição natural na hora precisa que pede a fala para uma pergunta ou comentário, sempre coerentes e com a voz baixa e grave. Um leve sorriso sempre encerra a frase e a sua ironia mansa.

A primeira vez que o percebi foi quando falou. Tratava-se da apresentação pessoal que se submete todo foca do curso, como acontece em qualquer início de aula em qualquer lugar novo. Quando revelou de onde veio, um município pouco conhecido, fez referência à cidade mais importante e próxima para tentar esclarecer a sua localização. Achei divertido aquilo. Primeiro porque já passei por sua cidade. Segundo porque a explicação se repetiu nos dias seguintes, sempre aborrecido com a obrigação de detalhar. Depois, pouco falou.

A nossa única aproximação aconteceu no dia em que sentamos lado a lado no refeitório. Apenas me ouvia enquanto eu falava para tentar contato. Não nos olhávamos. Certamente estava com as sobrancelhas arqueadas, ao mesmo tempo em que mastigava e ouvia o meu relato sobre a passagem por sua cidade e universidade. Por duas vezes, após silêncios, respondeu quando não se espera por respostas. Sobre a universidade, revelou predileção por autores marginais contemporâneos e por literatura africana. Sobre a sua cidade, confirmou a existência da cerveja local que mencionei, acrescentando que havia outra marca, mais consumida. Lembrei da bebida, mais barata e vendida aos universitários de orçamento apertado nos botecos e padarias de esquina. Quando terminava esse pensamento, ele já se despedia. Deixou dois pedaços da sobremesa, disse estar apressado e se retirou sutilmente.


PS: Este perfil foi produzido para aula do 19º Curso Estado de Jornalismo.

13 agosto 2008

Mandarim e caipirinha

Se fosse no Brasil, as dezenas de assentos vazios nas arenas olímpicas teriam sentido: aqui os cambistas reinam. Mas, a Olimpíada é do outro lado do mundo, e eu não sei se há esta ocupação profissional por lá. Apesar disso, o que se tentou fazer para impedir os clarões nas arquibancadas de esportes como judô, badminton e pólo aquático não é coisa de outro planeta. As autoridades chinesas lançaram mão do remendo, da gambiarra, do tal jeitinho que tanto nos orgulha (?). “Batalhões de torcida” (ainda bem que são “de torcida”), formados por voluntários com aquele mesmo agasalho azul oficial ocupam os lugares vagos para “melhorar a atmosfera”, torcendo por todos os competidores. Quanta cordialidade!

Até na festa do místico dia 8/8/2008 houve vazios na platéia. Mas o maior remendo, para quem não sabe, foi vocal. A pequena Lin Miaoke, de 9 anos e chamada de ‘anjo sorridente’ pelos chineses, aquela que o mundo inteiro viu interpretar Ode à Pátria, não cantou. Sim, ela dublou. Tudo bem, playback não é novidade. O problema é que ela jamais cantou. O diretor musical da cerimônia, Chang Oigang, revelou que a voz na festa era de Yang Peiyi, de 7 anos. A razão? Yang não era “bonita o bastante para se apresentar em público”. O que causaria dó e cartas penosas ao Mais Você por aqui, na China foi diferente. Chang disse que era preciso “colocar os interesses do país em primeiro lugar” e Yang afirmou que não se arrependia, feliz por “participar” da cerimônia.


Não é só isso. Wang Wei, vice-presidente dos Jogos de Pequim abriu a boca: nem todos os fogos de artifício foram reais, alguns foram imagens em 3D produzidas anteriormente no computador para se ter “efeito teatral”.

Doha que se dane. Os chineses conhecem e adotam o jeitinho tupiniquim e o Brasil já foi apresentado há tempos a todo tipo de bugigangas falsetas made in China. Para o progresso de tanto entendimento avançado, o “maior contrabandista do Brasil”, Law Kin Chong, bem que podia fazer às vezes da “maior furada da diplomacia brasileira”, o chanceler Celso Amorim. Coisa da China!

10 agosto 2008

God save the (big) panties

Como tem gente que não tem o que fazer e dinheiro de sobra coçando no bolso, às vezes aparece uma dessas. Uma canadense desembolsou 14 mil reais para pôr num quadro ou amarrotar em seu guarda-roupa, feliz da vida, uma calcinha da rainha Vitória. Calcinha? É, gente, calcinha de rainha não é uma simples calcinha. Se bem que nesse caso nem são as iniciais VR (Victoria Regina) que chamam a atenção. A peça, “discreta” e feita à mão, tem 127 centímetros de largura. Vejam que coisa graciosa.

O leiloeiro inglês Charles Hanson disse que a lingerie indica "uma senhora muito grande, de estatura bem baixa, com uma cintura muito larga”, sendo uma peça muito interessante historicamente. Interessantíssimo!

A rainha Vitória reinou na Grã-Bretanha de 1837 a 1901. A sua influência puritana e austera rendeu a denominação "vitoriana" para as criações (do comportamento à arquitetura) do período, também conhecido por "vitoriano". Também mastigou e comeu bastante as custas de milhares de operários famintos. Isso é bem interessante, mas o senhor Hanson não deve concordar comigo a respeito dessa história vitoriana.


Fonte: BBC Brasil

07 agosto 2008

Fogo, faca e faça-me o favor

Primeiro veio o ministro da Justiça, Tarso Genro, a defender a punição aos torturadores do regime militar no Brasil. Para Genro, os crimes cometidos durante a ditadura militar por certos indivíduos fardados foram comuns, e não políticos. Depois, Nelson Jobim, o ministro da Defesa que já foi presidente do STF, vestiu a camisa das Forças Armadas respondendo que tudo não passava de provocação aos militares e que se via obrigado a “apagar o incêndio” de Genro, mesmo depois do ministro da Justiça esclarecer que a punição não visava as Forças Armadas, mas indivíduos isolados e criminosos.

Hoje, o procurador da República Marlon Alberto Weichert alegou a favor de Genro, dizendo que os atos de tortura são crimes contra a humanidade, crimes praticados por agentes de Estado e sem respaldo político. Enquanto isso, os militares da reserva querem ser cobertos, por ironia do destino, pela bandeira da Lei da Anistia de 1979. Também hoje, o general Gilberto Figueiredo, presidente do Clube Militar deu sua “aula”: disse que Genro está agindo por “revanchismo”, que a sua fala foi um “desserviço” para o País, que há vozes em “sentido contrário” no governo (citou o ministro Nelson Jobim) e que o país, em vez de “ficar de picuinha” e “olhando para trás”, deve “consolidar” a democracia.

Seria cômico se não fosse tão trágico. Pelo menos, em tempos de “consolidação” da democracia podemos saber o que se passa pela cabeça de um general sessentista quando ele abre a boca. Em carta, o militar atacou a revisão da Anistia e disse que Tarso Genro faz questão de “lamber feridas”.


Em tempo: Em dezembro de 1998, Marcelo Paixão de Araújo, herdeiro do Banco Mercantil em Minas Gerais e tenente do exército entre 1968 e 1971, foi o primeiro militar a confessar crimes de tortura e revelar que matou “umas trinta” pessoas. A partir de 2006, o País acompanhou o processo movido contra um dos maiores torturadores do período militar, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, autor do pretensioso A Verdade Sufocada - A história que a esquerda não quer que o Brasil conheça. Mas, em 2008, a Justiça de São Paulo suspendeu um dos procesos e o outro (não encontrei informações) parece que se arrasta. Já em Brasília, no novembro de 2006, militares promoveram um “almoço de solidariedade” ao coronel Ustra, com uma faixa que trazia os dizeres: “Estaremos sempre solidários com aqueles que, na hora da agressão e da adversidade, cumpriram o duro dever de se oporem a agitadores e terroristas de armas na mão, para que a Nação não fosse levada à anarquia”.

Pena não haver uma faixa na frente da casa de cada boina da reserva com um pequeno lembrete para a "consolidação" da democracia: “Só se lambe ferida porque há ferida”.

29 julho 2008

FICÇÃO - Serafim

Matutar por Alzira, jamais. Figurasse nos dramas babosos, o sujeito sem eira a desabar, o Château Margaux reluziria estocado no peito. Não a branca fajuta, gritada sem licença no ouvido. Zumbido danado. Mas, quem mandou? Esse povo é formiga, teima e tropeça pelo Mercado, encontro marcado com o Xixi de Cobra, a escarlate saída na propaganda mole do pardieiro. “Amansa coração de corno infeliz” é como enganam. Se o da vez era Serafim, os veludos da tragédia do Velho Mundo são firulas a cargo de homem pela metade, tipo grã-fino, triste ou risadinha, nunca estalado nas pisadelas da vida. E Serafim era galhudo dito, sem a vergonha chorosa em admitir. Daí o destino ser todos os goles do Xixi de Cobra e a saudade banana de Alzira bandida.

O filho de D. Manteiga, a filha dum poeta de mentira, cresceu na pilha do jornal antigo do pai. Bunda nas manchetes, sentava bamba, imundo. Coceira vinha, espichava para a aula do velho. O último descabido foi “mulher é no cabresto”. Dia seguinte enterrava o sábio e embrulhava o aviso da véspera como do divino. Alzira só veio quando D. Manteiga avizinhou-se do pai na terra fofa, semana depois. O corte na oficina, serviço no “carro de baitola” do prefeito, veio à noite, caidinha, num presságio da perdição que crispou na porta. Assobio largo, tapete para o rebolado, ela girou. Levado no olhar dum cão, Serafim soltou a ferida, lambeu o beiço, deu bote e pelejou para cair no encardido. Denise, penúltimo enfeite da reboladeira, gostara do capô do baitola.

Três dias e ele achou Denise uma sabida. Deu nada. Na cama, lambuzado, batizou-a Alzira. O fuxiqueiro do povo sobrou e sete luas apagadas foi o tempo fora do batente, fincado nos lençóis do sobrado pelancudo. A rala freguesia jogava na mão do basbaque, que corria o arame para a gaiata. Coisa feita. Arruína.

Desavisada, a mulher mendigou por artista na rua porque o último querer da febre de Denise contagiara o mau juízo de Alzira. O chifrudo, mais desavisado, pinçou o enfarte ao invadir o mimo sem pestanejo, o quarto dos fundos só dela. Um ateliê improvisado, com Alzira em pêlo no chão e o prometido rabudo no ensaio do pincel, faziam do retrato do avô, coisa do espólio de D. Manteiga, testemunha. Serafim sangrou os dois. Para apagar a luz, esforçou-se. Ficou cego de tal modo que não viu o avô, metido a Dalí do Cordel nos tempos de baião sem culpa, rolar uma lágrima no retrato.

Reconheceram Serafim no Mercado. Lembrava do cabresto do pai e tropeçava.

Imagem: Oswaldo Goeldi ("Abandono")

10 julho 2008

Qüiproquó

Valores é plural da idéia solta e vaga que dizem rechear a moral, outra idéia flutuante e sem RG. De tanto lhe falarem e apontarem, feito a mais astuta carola com o dedo em riste e dirigido à dama do baixo meretrício, extraiu-se a única certeza de um suco abstrato: cada um tem os seus valores, mesmo que não saibamos dizer o que são, de onde vêm e para que servem. E, se fabulamos “cada um no seu cada um”, a coisa fica mais relativona, gotículas de ameba sobem e descem no ar, tudo legalize e naquele “vamo que vamo”, take it easy, entre outras amareladas.


Uma dúzia é a quantidade de vezes em que, embora com mala na mão e o tempo dando uma de inimigo, já fui obrigado a esperar um fluxo de 10, 15 pessoas entrarem no vagão do metrô para apenas depois poder sair dele. Faz sentido, não? Você não acha? Lógico que faz, eu sempre estive equivocado em pensar que deveria sair antes dos outros entrarem. Quanta ignorância, a minha! Nada como viver. Papai já me dizia que a vida é uma escola. Uma escola bem ao contrário, mas vai assim mesmo.

Ontem, eu e um amigo aguardávamos uma vaga no estacionamento, posicionados atrás, como deve ser, à espera da saída de outro veículo. Neste momento, um Astra preto, que já havia ultrapassado aquele trecho, dá ré e insiste para que também nos afastemos. Se dependesse do caranguejo preto, uma fila inteira estaria em marcha ré, porque aquela vaga lhe pertencia, da mesma forma que os campos franceses estavam justapostos ao espólio real e azul de Luis XIV. Mas, meu amigo não se mexeu. Comprou a rixa. Buzinadas, caras emburradas, o estacionamento lembrava uma creche depois das briguinhas pelo jogo que acabou sem final, com a apelação do dono da bola que, claro, a levou para o quinto dos infernos.

Último ato: a mulher que estava no passageiro do Astra desce, se posta na vaga, só falta deitar no perímetro cobiçado e sujar seu casaco Adidas. Estacionamos mesmo assim. E ela, se fazendo de indignada, veio aos nossos ouvidos: “Vocês são muito sem educação, viu?”.

Isso são valores. É igual a bumbum.

25 junho 2008

Recriar é morrer

Quando era criança, meus parentes mudavam de canal e eu via a imagem da televisão variar, quase sempre, entre Globo e SBT. Eram tempos pré-tv paga, em que He-man no meio do programa da Xuxa (chamava-se Xou da Xuxa), era a delícia daquelas manhãs.

Bem, quero dizer que Globo e SBT eram as duas potências. Lembro da Manchete, com aquele cara de sotaque italiano a comentar os jogos do Calcio, que mais tarde descobri tratar-se do também mestre cuca Sílvio Lancelotti. Gostava da sua voz rouca e fala que desvirtuava com frequência o jogo pancadão e na retranca dos italianos, tudo narrado sobre aquela imagem distorcida do canal 2. Até o carnaval na Sapucaí tinha outro gosto sem a Globeleza. Havia um boteco do samba, acho que era isso. A Manchete também se tornou forte e audaciosa quando peitou a dramaturgia global com o sucesso "Pantanal". Como nada visto antes, a criação de Benedito Ruy Barbosa arranhou o império dos Marinho pré-Projac. Foi tão marcante que a imagem do berrante a guiar a boiada ficou viva na minha mente desde menino. Mas, repito: as potências eram Globo e SBT.


E nem precisaria usar a memória para relembrar, porque a "TV" do Sr. do Baú injetou um "Vale a pena ver de novo" sem pena a partir do último dia 9. Socou "Pantanal" 18 anos depois e prometeu até pagar os atores. Sem falar do tamanho empenho em mudar e desmudar o horário de telejornais desprovidos de identidade e força, implantar atendimento ao vivo ao telespectador (para desespero dos âncoras), demitir mais de 40 jornalistas um mês após reviver o também cenozóico Aqui Agora e anunciar a programação referindo-se aos horários e nomes de programas das emissoras concorrentes, na cara-de-pau e sem vergonha. E foram muitas outras firulas difíceis de entender.
Nem Sabadão Sertanejo (lembram?) resistiu ao século XXI. Escrevam: não faltará pouco para o Sistema Brasileiro de Televisão se tornar o Canal 24 horas Chaves. E nem faltará bordão: "todos atentos olhando pra tevê". Todos? 2008:Quem muda de canal para o SBT?

16 junho 2008

Língua afiada para quem pode

Invejo os bons definidores e as suas sentenças. Esta é uma arte não remunerada, pouco reconhecida, mas arte. Na Carta Capital desta semana, na edição especial de nº 500, Thomaz Wood Jr. diz que "a literatura de negócios é um misto de literatura infantil com apelos de auto-ajuda". Quem duvida? Os best sellers esporadicamente copiados, recopiados e amaciados por e para esse nicho são um soco no estômago do bom senso. Leia uma orelha destes "livretos". Assustam. Thomaz Wood só esqueceu de dizer que, além dos apelos de auto-ajuda mixados com literatura infantil, há uma eminência louca de esoterismo em alguns exemplares mais recentes. E, caro Wood, coitada da boa literatura infantil, ela não merecia comparação tão baixa.

Outro definidor bom e preciso é o Walmor Chagas. Ontem, li uma descrição sua, daquelas de dar arrepios e sacolejos de inveja. Deu a sentença para o filme Um Beijo Roubado, ao qual assisti mês passado, me fez bem, tava cansado e necessitado da leveza do não-pensar, nem doeu, mas deixou a inércia de não conseguir dizer onde pecava o dito cujo. "É uma comédia romântica norte-americana fantasiada de filme francês" foi como Walmor matou a charada. Ele tem razão. Simples assim.



31 maio 2008

História de pescador

Veja bem, eu não nasci em São Paulo. Vim de Santos, aquele lugar que para alguns se resume a um porto, para outros atrasados a ainda cidade da AIDS e, no imaginário dos mais desinformados, uma vila litorânea com areia, sol, morro e mar. Só.
Sim, há quem pensa assim e, sempre ao ouvir um sujeito com essa idéia na cabeça, deduzia que a pessoa só poderia me visualizar como o caiçara nativo da ilha, trajando uma folha de bananeira - que se resumiria a toda roupa necessária neste habitat dos trópicos - e munido com lança de madeira afiada na ponta, aprumada para a pesca da manhã - que seria a dieta alimentar do local. Em plena globalização, essa idéia louca e surreal dava asas a minha própria imaginação. Como no Mundo de Bob, me via, pela lente dos outros, tal qual o sobrevivente da Lagoa Azul.

27 abril 2008

Virei

De sábado para domingo a cidade, o centro da cidade abriu caminho para a Virada Cultural. Na sexta, como em toda a semana, a propaganda foi grande. Na Globo local, uma mulher de meia idade estava exageradamente convicta: "É fantástico morar em um lugar que proporciona essas coisas sempre". Queria ter a chance de lembrar que a Prefeitura, recolhedora de gorduchos impostos, não faz nada excepcional ao garantir 24 horas por ano para um leque de atividades que apelidamos de lazer. É dever, mas deixando minha rabugice no túnel do metrô, fui para a rua.
Impressionante a noite avançar e ver a calçada e o asfalto tomados por gente e gentes. Diverso e anacrônico movimento pelas pistas, as leis de trânsito para as cucuias - se é que elas já não foram em dias comuns. Vi muita gente sorrindo, isso faz bem. Se há explicação, diria que por estarem ali, em hora pouco convencional, perambulando com o mesmo propósito, ou com o propósito de não ter propósito. Relax grupal.
No pé do Copan, o palco Meninas. Deu para conhecer e dançar os tuntuns de Marina de la Riva. Gostei. Indo atrás de banheiro num bar nas travessas dalí, uma batucada pára na rua, com aqueles tambores tipo Nação Zumbi que eu não sei o nome. Umas projeções geométricas na fachada branca de um edifício alto e o som na minha cabeça já foram enzimas suficientes para dançar uma espécie de boi bumbá, quando misturadas à cerveja quente que foi a que deu pra comprar por um preço justo. Momento espontaneidade, também bom.
Caminhada cruzando a praça da República, com a galera branca de preto, na cola de algum cabeludo com jeans agarrado e com a cara de "eu sou do rock". Esses pontos, em particular, sempre parecem extremamente adolescentes e não me trazem tantas boas lembranças, não sei bem a razão. Por isso, em frente, sigamos!
E aconteceu uma paradinha. Localizar os conhecidos sem GPS na esquina que fez, não sei se mais faz, alguma coisa acontecer no coração do Caetano. Dalí em diante era enfrentar a São João, com uma multidão esperando por Zé Ramalho. Nunca vi tantos fãs do dito cujo reunidos, mas meia hora, após cotoveladas, pular placas e quase beijar o asfalto, bastou para entender. Não havia fãs, havia a multidão, querendo cantar aquela que foi a última do set do Zé. No empurra-empurra de um curral de quatro quarteirões, todos foram fiéis: "ê, ô, ô, vidá de gado!!!".
Não dava para esperar os Mutantes. Aquela muvuca não enfrentaria nenhuma mutação positiva. Por isso, boa opção era rumar para Santa Ifigênia, onde o Boteco de Bambas estava armado e pegando fogo. O sorriso veio fácil, nem uma dor de barriga ingrata impediu o sambado sem jeito. E, no meio de crioulos e crioulas simpáticos e muito, muito mais educados que a turma do oba-oba no curral da São João, a Virada valeu a pena. Samba bom ao lado de gente boníssima.
Viaduto e Largo São Bento para o metrô. No largo, aliás, uma dúvida esclarecida. No guia da Virada havia a indicação de que alí montaram o Silent Disco, descrito como "discotecagem para fones de ouvido". É, era isso. Um silêncio só e um bando de "fonados" ouvindo e dançando juntos na pista. E havia fila para usar os benditos fones. Se nos ônibus e calçadas e metrôs já vemos tantos isolados com fones, um pedaço da Virada acolheu esse nicho emergente. Acho que era em respeito ao mosteiro.

Bem, foi isso. Dalí, casa. A dor de barriga teve final feliz e no domingo deu para ir ao Mercadão fazer programa de turista abocanhando aquele exagero de mortadela. Nada de show, corpo moído. Na volta, os "fonados" estavam lá no largo São Bento, nem ligando para o sol. Um silêncio...Coisa esquisita, fazer o quê!

Sei só que foi bom e bem diferente um final de semana em São Paulo assim, com outros sobressaltos, pelas esquinas outras alegriazinhas, tão diferentes das alegrias quadradas dos dias da semana. As minhas, ultimamente, costumam ser o pão na chapa com café com leite na padaria pela manhã e sentir aliviado na fuça a brisa baforenta que se desloca pelos túneis do metrô.


18 abril 2008

Com quem entende do riscado

“Veja bem, escolho temas que me instigam e a política é um deles, até porque o bom é falar mal e na política dá pra fazer isso”, alegou Angeli. Caco Galhardo, ao seu lado, já cortou: “Ah, eu não! Quanto tempo perdi numa mesa de bar falando de política? Que função isso teve? Tá tudo uma merda, aí você desenha e o cara olha a charge e fica chapado, sacia seu desejo e pronto, acabou”.

Angeli: “Você tá em crise, né?”. Gargalhada geral.

Esse foi o espírito do encontro
“Como fazer política com uma coisa chata, a política” que a revista Paiuí promoveu ontem aqui em São Paulo. Angeli, Laerte e Caco Galhardo deram e proporcionaram boas risadas ao lado do genial mediador Paulo Caruso - sim, aquele que desenha no Roda Viva.

Paulo Caruso, aliás, apenas 20 minutos após o início do debate caiu na real: “ah, agora eu entendi, estou aqui porque o Galhardo escreveu na Piauí que está de saco cheio de política”. Outra onda de risadas. E foi assim, relembrando marcos como o
Chiclete com Banana, que eles abordaram a política como sempre bem fazem: com humor. Da platéia mandaram: "o que é brochante na política?". Galhardo não hesitou: "Tudo que dá certo em política é brochante. Se dá certo não dá pra falar mal".

Claro, ouvi os murmurinhos adolescentes na fila de trás: “São uns niilistas”. Baboseira. Gostei bastante do Angeli admitindo que fez Chiclete porque já sentia a deterioração da ditadura e porque sempre achou bom falar de costumes, comportamento. “O Ziraldo, o Jaguar, esses caras foram importantes no
Pasquim e tal, mas antes da ditadura a matéria-prima do desenho deles era essa que eu gosto, que é o comportamento”, disse.

E foi o Angeli que me deixou emocionado ao relembrar o Henfil. “Eu e o Henfil brigamos, ele era difícil, chato. O arquivo dele era irritante. Surgia um tema, ele levantava e dizia ‘eu já tenho!’. Corria para o arquivo e voltava com a charge. Irritante”. E completou: “Há um tempo falaram sobre um tema e eu pude, enfim, dizer: ‘eu já tenho’. Senti um orgulho fudido”.



"Política é uma merda!"(Caco), "Política é brochante porque quem faz política não têm tesão" (Angeli),"Eu não trabalharia na Veja. Tenho nojo da Veja. Eu abro, leio o Millôr, e só" (Laerte).

10 abril 2008

Quem viu Zé Pereira?

Uma nova revista descobri apenas na semana passada. A revista Zé Pereira, do Rio de Janeiro. Ela foi mencionada naquela seção Revista das Revistas do Estadão. O jornal deu destaque para o magazine carioca, que é isso mesmo: carioca. Apenas abri o site da publicação, louco de curiosidade. Há coisas como "D. João e o bacanismo carioca" e a entrevista "Gerson King Combo e os Mandamentos Black", sem falar de uma coluna rica de ricos cronistas inesquecíveis. Destaque para o "escrivão" Lima Barreto, o grande pingente da nossa literatura. Alguns de seus textos agora estão na Zé, ao lado de arte, rádio e humor debochado, na boca dos personagens que os cariocas bem devem conhecer de longe.



Sim, vale a pena conferir a revista lá do Rio que, pelo que vi, custa apenas 2 reais. Segundo o Estadão (exageradamente naquele estilão "revista piauí é a ressureição da Realidade"), as reportagens da Zé Pereira são resultado do "corpo-a-corpo com a realidade". Na verdade, só prestei atenção na Revista das Revistas quando passaei os olhos por esta expressão. Pensei: Opa! é coisa do João Antonio, que escrevia exatamente a coluna Corpo-a-corpo no Última Hora. Ledo engano.

Não vou desconfiar de Zé Pereira, que tem a sua beleza e valor. Afinal, não deve ser fácil fazer o que fazem na era Veja. Mas, o Estadão foi fanfarrão. Corpo-a-corpo só João Antonio. No Rio, vá bem, mas sem Pereira nem Macieira pra fazer sombra, rapá!

03 março 2008

Feito sabiás, partimos

Oficialmente"cabou-se". Foi indescritível pisar em Bauru nesta "última vez". Foi com a família, sempre atenta aos abraços dos amigos, mal sabendo o significado de muitos deles. Colação foi aquela cerimônia de sempre, que sempre caçoamos, todos os anos, mas quando a pieguice quedou para nosso lado, segurar as lágrimas foi desumano. Chegou a vez da comemoração desse grupo, dessa comunidade de amigos, dos fazedores de histórias belas e inesquecíveis na UNESP, nas ruas e nas nossas viagens. Queria abraçar infinitamente todos vocês a todo instante. Se 4 anos de universidade - universidade com todas as letras e significados - passaram e renderam uns 30 anos de vida, esses dois dias de "até logo", "tchau" e de "valeu, meu véio" foram um furacão. Na volta, logo no domingo, um filme passou em minha cabeça. Fórum; Uni (o prédio-caverna do meu 1º ano de unespiano); todos, todos os protagonistas dessa história; congressos; interunesps; festas de república; iniciação científica e a amizade de professores que souberam ser mestres; as greves e suas consequências; a rua onde criei coragem e comecei a namorar a Ju (a namorada, amiga e companheira de 3 dos 4 anos de UNESP); a minha ex-república, sempre cheia de contradições enriquecedoras; os cantos e recantos da "cidade sem limites". Na verdade, não houve limites mesmo foi para relembrar.Porque as lembranças são muitas, se confudem e agora fazem parte de um relicário dos melhores anos da minha vida. Melhores porque estiveram preenchidos por grandes, enormes personagens. E eu amo vocês. Se é para ser piegas de vez, saibam que valeu muito a pena. Em cada esquina de Bauru me veio alguma lembrança, e parece mesmo que aquela cidade guardou, sorrateiramente, algum pedaço de todos nós.

19 fevereiro 2008

São Paulo deserto no peito




São Paulo cansa fácil. Fui acostumado a visitar ruas, pontos e eventos magnetizadores de multidões vez ou outra, exatamente porque tudo era isso mesmo: uma visita. E sempre, como na vida e com as pessoas reais, a primeira impressão pode ser a que chamamos de "boa". A "terra das oportunidades", que um dia foi sem propósito chamada de "cidade que mais cresce no mundo", cansa, não descansa e nem dá descanso aos cansados. Desde janeiro gasto, literalmente, a sola do sapato "camelando" neste deserto. Sim, no meio de milhões, a terra da garoa sabe se tornar um eito sem fim e ser sentida como um Saara no coração. Atrás de trabalho vou, entendendo direitinho e todos os dias que tudo é vendável e que tudo se vende. A cidade ainda é bela aos meus olhos, afinal, são nos olhos e passos dos habitantes daqui que vejo as sutilezas, inclusive no corre-corre do fim do dia, em que homens e mulheres erguem guarda-chuvas e só querem chegar em casa, no bar, na igreja, no clube, na praça, no raio que o parta, mas chegar lá onde há alguém esperando que logo cheguem. No meio de desconhecidos, saímos todos em largada de maratona quando os semáforos se abrem, num compasso doido só para estacionar tempo depois, encostados e perto de conhecidos. É tudo corrido porque é para deixar o Saara sair do peito.
Um sábio amigo e mestre já me perguntou se realmente gostamos dessa cidade. "Na verdade, não odiamos isso tudo?". O mesmo me disse para ter cuidado, porque São Paulo pode nos engolir facilmente. Ela me engole com feijoada às quartas e sábados, para o bem e para o mal. E eu nem posso imaginar como existiu um Meninão do Caixote por estas bandas um dia, ou como agiria se euzinho fosse engolido nos tempos em que o suicidouro do Viaduto do Chá dava uma verdadeira colher de chá para os perdidos e cheios de Saara no peito.