26 outubro 2008

No Peru

A “cidade dos reis” e capital do Peru não está acostumada às chuvas, apesar do característico céu nublado. Contrariando a média de três milímetros para outubro, uma leve garoa molhava Lima na manhã do dia 21. O chuvisco não exigia guarda-chuvas. Na paisagem do mirante da praia de Miraflores, a vida continuava com cara de cartão postal e, pelas ruas centrais, as pessoas andavam à vontade, apesar de surpreendidas pela água. Nos cruzamentos mais disputados, onde a negociação da passagem se dá com festa de buzinas e má sinalização, a colisão dos amassados e remendados carros dos anos 80 parece inevitável.
Nas obras que se avolumam na cidade, operários se concentram nos trabalhos em asfaltos e viadutos. Lima abre espaços, em esquinas de bairros como San Isidro, para concentrar fast foods. Parece piada: a cozinha peruana, com seus pesacados e influências criollas, é admirada em todo o mundo. Nos três dias na cidade optei pelo típico, como ceviche e pisco.
Pelas ruas, mesmo no dia da chuva, a construção civil avançava. Até parecia alheia ao caos no trânsito e aos recentes escândalos com grampos do governo federal.



A rápida passagem pelo Peru reservou bons momentos e alegrias, excetuando a mística e inusitada Inca Kola, o refrigerante que, nacionalismos à parte, lembra mais um chiclete líquido.

Na madrugadada do dia 22, o Tequila Rock da avenida La Marina fervia. Uma música de difícil explicação. Nada a ver com a tradicional marinera peruana. No ambiente cheio de vídeos um tanto calientes, o ritmo parecia misturar funk carioca com a tecnera da cúmbia - aquela dança do Tévez, lembram? Mais difícil era quebrar o quadril para dançar como todos peruanos que engatavam em pares nada comportados. Foi divertido. Do palco, dois locutores comentaristas (???) nos acharam: "a los estranjeros!".

No dia seguinte, entre outras coisas, o corpo moído depois das Cusqueñas bebidas na noite anterior. Por razões misteriosas, nosso grupo encontrou ânimo para jogar futebol com os peruanos, num gramado da pobre Cañete, 190 km ao sul de Lima. Niños e niñas gritavam por "avante brasileños, vá Ronaldinho!". Nós, os sedentários e barrigudos, tínhamos o esforço estampado na cara, tudo para corresponder à megalomaníaca expectativa da população infantil do local.
Resultado final: Peru 1 x 0 Brasil. Desculpas às crianças de Cañete, fica para a próxima.



mais fotos no Peru

20 outubro 2008

A tabacaria do Sul

Santa Cruz do Sul é o epicentro do tabaco no sul do Brasil. Quem está perdido por alí, na cidade pacata de 115 mil habitantes, não deve acreditar que as folhas em linhas sem fim, nas lavouras ao redor do município, são de alface. São Virgínias e Burleys que fazem a alegria das processadoras de fumo (a maioria norte-americana) e das cigarreiras. É um complexo industrial fortíssimo.
Os homens que dirigem as empresas e as entidades do fumo nessa região são precavidos. Se em algum momento são orgulhosos do clima e terra tão propícios ao tabaco, em outros falam de prevenção do trabalho infantil, baixo uso de agrotóxicos, cultura do fumo herdada dos antigos colonos alemães, importância do Brasil no mercado mundial e por aí vai. Também falam sobre necessidade de diversificação de culturas, o que parece um paradoxo, afinal eles fazem muito, muito dinheiro com o tabaco. Mas eles garantem que não: a diversificação é importante e essa é a luta.
Só no ano passado, as 755 toneladas que o Brasil exportou para o mundo todo renderam US$ 2,2 bi. Só com tributos sobre o cigarro o Tesouro Nacional recolheu R$ 7 bi. Em Santa Cruz do Sul, nas sedes de cigarreiras e produtores, não vi um só fumante.

Articulado também é o sr. Milton Fuelber, de 47 anos. Ele foi apresentado pela Alliance One, beneficiadora de fumo, como produtor modelo do sistema integrado de produção que as empresas incorporaram ao lugar. Na última safra, Milton colheu mais de 12 toneladas de tabaco que secaram nas estufas de sua propiedade. Com fala eloqüente, ele nem parece preocupado em plantar mais milho do que fumo. O bolso agradece. O hectare do primeiro vale R$ 1,2 mil; o do segundo bate os R$ 15,1 mil.



Catedral de Santa Cruz do Sul