25 junho 2008

Recriar é morrer

Quando era criança, meus parentes mudavam de canal e eu via a imagem da televisão variar, quase sempre, entre Globo e SBT. Eram tempos pré-tv paga, em que He-man no meio do programa da Xuxa (chamava-se Xou da Xuxa), era a delícia daquelas manhãs.

Bem, quero dizer que Globo e SBT eram as duas potências. Lembro da Manchete, com aquele cara de sotaque italiano a comentar os jogos do Calcio, que mais tarde descobri tratar-se do também mestre cuca Sílvio Lancelotti. Gostava da sua voz rouca e fala que desvirtuava com frequência o jogo pancadão e na retranca dos italianos, tudo narrado sobre aquela imagem distorcida do canal 2. Até o carnaval na Sapucaí tinha outro gosto sem a Globeleza. Havia um boteco do samba, acho que era isso. A Manchete também se tornou forte e audaciosa quando peitou a dramaturgia global com o sucesso "Pantanal". Como nada visto antes, a criação de Benedito Ruy Barbosa arranhou o império dos Marinho pré-Projac. Foi tão marcante que a imagem do berrante a guiar a boiada ficou viva na minha mente desde menino. Mas, repito: as potências eram Globo e SBT.


E nem precisaria usar a memória para relembrar, porque a "TV" do Sr. do Baú injetou um "Vale a pena ver de novo" sem pena a partir do último dia 9. Socou "Pantanal" 18 anos depois e prometeu até pagar os atores. Sem falar do tamanho empenho em mudar e desmudar o horário de telejornais desprovidos de identidade e força, implantar atendimento ao vivo ao telespectador (para desespero dos âncoras), demitir mais de 40 jornalistas um mês após reviver o também cenozóico Aqui Agora e anunciar a programação referindo-se aos horários e nomes de programas das emissoras concorrentes, na cara-de-pau e sem vergonha. E foram muitas outras firulas difíceis de entender.
Nem Sabadão Sertanejo (lembram?) resistiu ao século XXI. Escrevam: não faltará pouco para o Sistema Brasileiro de Televisão se tornar o Canal 24 horas Chaves. E nem faltará bordão: "todos atentos olhando pra tevê". Todos? 2008:Quem muda de canal para o SBT?

16 junho 2008

Língua afiada para quem pode

Invejo os bons definidores e as suas sentenças. Esta é uma arte não remunerada, pouco reconhecida, mas arte. Na Carta Capital desta semana, na edição especial de nº 500, Thomaz Wood Jr. diz que "a literatura de negócios é um misto de literatura infantil com apelos de auto-ajuda". Quem duvida? Os best sellers esporadicamente copiados, recopiados e amaciados por e para esse nicho são um soco no estômago do bom senso. Leia uma orelha destes "livretos". Assustam. Thomaz Wood só esqueceu de dizer que, além dos apelos de auto-ajuda mixados com literatura infantil, há uma eminência louca de esoterismo em alguns exemplares mais recentes. E, caro Wood, coitada da boa literatura infantil, ela não merecia comparação tão baixa.

Outro definidor bom e preciso é o Walmor Chagas. Ontem, li uma descrição sua, daquelas de dar arrepios e sacolejos de inveja. Deu a sentença para o filme Um Beijo Roubado, ao qual assisti mês passado, me fez bem, tava cansado e necessitado da leveza do não-pensar, nem doeu, mas deixou a inércia de não conseguir dizer onde pecava o dito cujo. "É uma comédia romântica norte-americana fantasiada de filme francês" foi como Walmor matou a charada. Ele tem razão. Simples assim.