17 abril 2007

O último adeus dos que já foram

Há tempos uma pilha do jornal que assinamos só crescia na sala da nossa república. Há tempos também dizíamos: "vamos reciclar, jogar fora, mas não sem antes recortar o que pode ser útil".
Há 4 dias começamos a cumprir a promessa, para desepero das traças que morrerão de fome sem suas manchetes. O trabalho é chato, até porque os jornais costumam amarelar, desbotar com o tempo e dissipar pelo ar um cheiro podre de vinagre se reabertos meses depois de largados no canto.
Essas, porém, não foram as únicas conclusões com as "releituras" dos defuntos papéis. Após uma hora de empenho nos recortes, a dor nas costas já me tirava os restos de bravura em consultar papel fedido. Desisti de passar os olhos por tudo. Sem remorsos.
Saldo final da minha rapa: algumas crônicas, duas matérias sobre a transposição do São Francisco, outra sobre Llosa, uma sobre Woody Allen e uma foto do Luxemburgo de 1990, no comando do Bragantino.
As crônicas se justificam, pois não as li e vou fazer isto antes de, provavelmente, elas serem despejadas de casa; as matérias do Velho Chico são uma incógnita, acho que é dorzinha na consciência por não ter me interessado pelo assunto, ou saudade do Nordeste mesmo; as de Llosa e Allen são por curiosidade em dar uma checada na besteira que o jornal publicou sobre eles desta vez; enquanto a foto do Luxemburgo é motivo pessoal, familiar. Vou mandá-la para uma tia distante, que o adimira, só pra mostrar, de pirraça mesmo, como o homem do black tie já teve seus dias de Sidney Magal.
Como tudo na vida traz uma lição, já dizia e diz D. Valdice, minha vovó, aprendi que jornal é jornal. A natureza do jornalismo emboca na efemeridade do ontem, que amanhã será anteontem. Pode doer para quem pretende escrevê-lo todos os dias, mas isso é fato. É verdade também que a dor maior - pelo menos deveria ser - é por alimentarmos memórias efêmeras.
As reflexões vieram logo após as dores nas costas, mas não vamos esquentar a cuca com isso. No final, o vinagre sumiu, as mãos pretas levaram um bom detergente e quem aqui está lendo não vai saber qual é o jornal que assinamos porque não vou fazer propaganda de graça, oras.
E, saibam todos, a matéria alfineta o Woody Allen. Pobre Woody Allen!

Nenhum comentário: